Museu Virtual Wesley Duke Lee

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Antonio Almeida
Armando Vasone
Augusto Lívio Malzoni
Carlos Dale Júnior
Heitor Sant’anna Martins
James Arthur Lobo Lisboa
Paulo Nazareth Kuczynski
Roberto Alban

Anos 1960

As obras do Wesley incluem referências da época, que formaram sua própria poética – após a aprendizagem com Plattner. Mais do que isso, os anos 60 são para Wesley marcados pela consagração, participações em Bienais, criação de “happenings” e uma intensa produção artística.

A sua estética, durante o período, aproxima-se dos traços de Sá Nogueira, Álvaro Lapa e António Areal, por exemplo. Tais artistas, incluindo o Wesley, captaram o “zeitgeist” da produção artística do momento, conseguindo reunir as preocupações (e as desconstruções) formais com o contexto histórico e social da década.
Investigando o feminino – até mesmo o seu próprio lado feminino – Wesley começou a compor as Ligas, conjunto de obras que se estende por três anos desde 1960. De acordo com Cacilda Teixeira da Costa, Wesley “rende ao feminino seu serviço amoroso, ritual profundamente sentido no ato de percebê-lo e representá-lo visualmente” (2005, p. 53).

A beleza dos corpos não se distanciava do próprio prazer do seu traçado, do fazer artístico. As pernas, os torsos, os seios situam-se no limiar entre figuração e abstração, e o erótico não se contém apenas no desenho pronto, mas no próprio gestual que leva até ele.

Vale lembrar que, no Brasil da década de 60, a nudez e o erotismo não ocupavam um lugar de destaque numa possível revolução artística ou cultural. A mudança viria na década de 70, tendo Wesley antecipado e previsto, uma década antes, as ideias que permeariam a próxima década.

Happening: o grande espetáculo das artes

Confirmando o seu lugar na história da arte, em outubro de 1963 Wesley realiza o primeiro happening do Brasil, no João Sebastião Bar, em São Paulo. Era o momento em que, no mundo, grandes artistas realizavam acontecimentos inéditos e de duração limitada. Nomes como Allan Kaprow, John Cage, Joseph Beuys, dentre outros, estabeleceram a tradição dos happenings nos Estados Unidos e na Europa. No Brasil coube ao Wesley ser o sucessor natural destes artistas no Brasil.

L’enfant térrible

Segundo o cineasta e amigo de infância – Olivier Perroy, Wesley era o “l’enfant térrible” das artes brasileiras.

Discorre Perroy: “Desde sempre Wesley Duke Lee foi ‘l’enfant térrible’ desafiando os conformismos quaisquer que fossem”.

Acreditava que assim despertaria uma nova consciência, de melhor qualidade, na sua audiência. Viril, sedutor, sensível, solitário, vulnerável, com ar jovial, sarcástico, divertido, e bom conversador; sofreu a rejeição exercida pelo meio artístico brasileiro. Foi discriminado por razões ideológicas e preconceitos políticos.
Independentemente disso, fez obras inteligentemente críticas ao regime militar que comandava o país e a censura na época”.

“Deslocado no meio da descrença”, como disse o prof. Walter Zanini, reagia com provocações divertidas, mas também bombásticas. Praticava a fértil arte do “divertissement”.

Independente por natureza, odiava balizamentos políticos que, segundo ele, “limitam a liberdade de criação”. Na sua cabeça não havia espaço para radicalismos políticos quaisquer que fossem.

Dele disse também o professor Zanini: o Wesley Duke Lee é o maior expoente da geração de artistas brasileiros das décadas de 60 a 90; tal fato não poderá continuar a ser ignorado pelos atuais críticos e estudiosos da história da arte no Brasil.”

O nome do cadeado é: As circunstâncias, 1966
óleo s/ tela, montagem com obra de Almeida Júnior, espelho, cabelos, cadeado e estrutura de alumínio, 197 x 70 cm, 136 x 60 cm e 150 x 56 cm
A zona: delírio e realidade durante o regime militar

A partir de 1964, ano em que o regime militar tem início no Brasil, Wesley começou a realizar uma série de trabalhos que denominará de A zona. Várias dezenas de obras que se relacionavam às zonas mentais e de perceção humana: estão presentes nessas zonas os questionamentos sobre a origem, a vida, a morte,
o amor, o erótico, enfim, abarca toda a diversidade dos pensamentos e das relações entre o psíquico e a realidade.

Não raramente, as obras d’A zona apresentavam cortes pictóricos, como para evidenciar a ligação do sensual com o real, contrapondo os delírios à fina camada da vida.

A questão política também ficaria evidente nessa série de obras, e uma dessas zonas será a ética, como diz Cacilda Teixeira da Costa (2005). Wesley coloca o momento político de uma maneira mais elevada e abstrata, saindo da rigidez dos discursos prontos e radicais. Completa Cacilda:

“Pela própria experiência plástica, Wesley expressou a consciência do equívoco da ação revolucionária dos artistas por meio das obras e, por ser um provocador, começou publicamente a criticar as atitudes “guerrilheiras” de alguns colegas, sendo mal-visto num momento em que muitos assumiam posições. Foi uma época tensa, nalgumas ocasiões trágica, e as suas opiniões, contrárias ao sentimento de esquerda da maioria dos artistas, causaram choque e rejeição”.

Uma obra iniciada em 64 e só concluída em 1972, “Hoje é sempre ontem”, pode ser caracterizada como a mais contundente de Wesley dentro das críticas à situação política brasileira da época.

A Escola (de arte) Brasil: construindo a história da arte brasileira

Outros dois momentos importantes na carreira de Wesley – na primeira metade dos anos 60 -foram a criação do movimento artístico Realismo Mágico e as aulas para os alunos que se tornariam seus discípulos.

Em 1962, Wesley recebeu como aluno Frederico Nasser, que o procurou para receber formação para se tornar artista. Em 1963, juntaram-se a Nasser, Carlos Fajardo, José Resende, Luiz Paulo Bavarelli. Com duas aulas semanais (uma de desenho e outra de composição), o curso acontecia de forma experimental através de uma atitude aberta, que explorava o potencial de cada aluno. Wesley, dessa maneira, seguiu os passos de Plattner, apresentava-se como mestre, para os “novos discípulos”. Na década de 70, Fajardo, Nasser, Bavarelli e Resende fundaram a Escola de Arte Brasil. Em agosto do mesmo ano Wesley funda, em São Paulo, o Movimento do Realismo Mágico, com o crítico Pedro Manoel Gismondi, a pintora Maria Cecília Gismondi, o fotógrafo Otto Stupakoff e o escritor Carlos Felipe Saldanha.

O Realismo Mágico constituía um movimento capaz de trazer a magia e o encantamento de volta às artes, num período marcado pela abstração esvaziada de almas. Um misto de “brincadeira e manifesto”, o Realismo Mágico era do Wesley para si mesmo, mas aberto a todos que quisessem desfrutá-lo.

Wesley chegou a dar aulas na Faculdade Presbiteriana Mackenzie, na Escola Superior de Desenho Industrial de Ribeirão Preto, e no projeto Art & Technology em Los Angeles, no County Museum. Cacilda Teixeira da Costa cita Reynaldo Roels, ao escrever sobre a influência de Wesley numa geração inteira de artistas brasileiros:

“Fala-se muito de sua influência sobre a geração paulista de Nelson Leirner e da escola Brasil:, de Luis Paulo Bavarelli, Carlos Fajardo e José Resende, e muito pouco sobre o “efeito Wesley” fora do circuito da Paulicéia. Mas, na verdade, a ele muito deve toda a geração da crise brasileira, do Rio a Brasília: a geração de Antonio Dias, Rubens Gerchman e Carlos Vergara, de Cildo Meireles e Luiz Alphonsus, Antonio Manuel, Artur Barrio e Ivald Granato (que naquele tempo estava ainda no Rio) – para mencionar apenas estes. A sua dívida para com Wesley certamente não está na visualidade que ele estabeleceu (embora aqui e ali reconheçamos procedimentos formais que viriam a alimentar toda a arte dos anos 60 e muita dos anos 70), mas nos fundamentos que sustentam toda a arte da resistência do período, a capacidade de, sem perder o pé da realidade da arte (e está aí toda a dificuldade), transformar em metáfora a realidade do lado de fora da arte.”

Uma vez Wesley disse: “Não me sinto professor e a arte não se ensina; ela está escondida dentro de cada um podendo ser revelada com estímulos”.

Referindo-se aos seus alunos disse: “(…) provoco vivências que os tornem capazes de transformar a visão da rotina quotidiana em metáforas. Procuro desenvolver também a qualidade e o foco da visão de cada um. Forneço experiências para que ampliem a sua consciência, para que aumentem o seu potencial imaginativo. Pois como sabe, a imaginação é a conexão básica entre o visível – rotineiro – e o invisível, onde está um campo ilimitado de ideias.”

Este modo experimental de formação artística do Wesley, deu certo: os seus 4 discípulos tornaram-se artistas de sucesso e formaram a Escola Brasil – na qual os seus cerca de 2000 alunos, com certeza, foram influenciados pelo mestre.

No fundo, seus pensamentos estimulantes deixaram marcas indeléveis em todo cenário das artes no Brasil, entre os anos 60 e 90. E assim sem se tornar professor (no sentido estrito), cumpriu a missão de transmitir generosamente os conhecimentos, o que aliás, deu origem ao Wesley Duke Lee Art Institute, em São Paulo.”

Japão, 1965: consagração pública e internacional

Segundo Cacilda Teixeira da Costa1: Wesley foi para o Japão por indicação de Pietro Maria Bardi para participar da VIII Exposição Internacional de Arte do Japão, a chamada Bienal de Tóquio, em 1965, tendo como comissário do Brasil o professor Walter Zanini, na época diretor do Museu de Arte Contemporânea da USP. A sua participação, com cerca de dez pinturas recentes foi um sucesso: ganhou o prêmio Associação Internacional do Japão para Difusão da Arte. Depois da mostra, permaneceu cinco meses no Japão onde realizou uma exposição individual na Tokyo Gallery, uma das mais importantes do país.

O prêmio consistiu num certificado e uma máscara Nô, do teatro clássico japonês. Ao recebê-la, Wesley declarou em tom premonitório:

“Esta é a máscara do Japão, impassível e aparentemente sem emoções. Agora eu vou olhar atrás da máscara e tenho a certeza de encontrar muita coisa, surpresas talvez. Dessas surpresas nascerão ainda outros desenhos.2

E teve razão, pois certamente foi um dos melhores momentos da sua vida artística e pessoal.

Já admirava o Japão graças aos filmes a que assistia no bairro da Liberdade, em São Paulo. Mas, chegando ao Japão, foi profundamente tocado pela cultura do país e, aproveitando as oportunidades que lhe abriram o prêmio da Bienal; visitou museus, templos e coleções, assistiu a apresentações de música tradicional e fez cursos de Sumi-ê, usando a caligrafia enquanto expressão visual e gestual.

Participou de duas Gaichi-ku (reuniões para treino intensivo de karaté) e numa delas, no templo da Lua em Yamagata, realizou a primeira experiência de transformação do que havia aprendido nas aulas de caligrafia em pinturas, que chamou de Aberturas. Enquanto se desenrolavam as lutas, ele ficava pintando ao lado do tatame, imerso na energia do ambiente.

Motivado pelo afã de “encontrar a fonte secreta”, ou seja, o motor da inspiração de que estava sempre à procura, além da curiosidade de descobrir um mundo totalmente inédito, percorreu Tóquio e fez várias viagens pelo interior. Ia de motocicleta, em companhia dos jornalistas e fotógrafos Lenita e Olivier Perroy, amigos de juventude que já se encontravam por lá e falavam o idioma.

Foi na companhia da Lenita e do Olivier, com quem permaneceu cerca de um mês imerso no quotidiano de um templo em Kyoto, participando de rituais e situações iluminadoras, totalmente consciente de estar vivendo um momento muito especial da sua vida.

Dessa verdadeira ‘viagem filosófica’ ficaram alguns registros em obras como O Barão de Macaúbas está em Nikko, em que reproduz, na tela, os pequenos macacos esculpidos na entrada de um pavilhão do templo; inúmeras obras das séries A Zona; dois conjuntos de pinturas de grande porte: Yukiko-E e Cinco Comentários Ternos Sobre o Japão ou Obrigado Japão.

No primeiro, ele debruça-se sobre imagens do mundo feminino japonês, mostrado em diferentes momentos da vida de uma mulher, sensivelmente afastando-se do imaginário erótico exaltado que predominava nas suas obras anteriores sobre temas femininos. Já em Cinco Comentários…, faz uma re-leitura de temas japoneses paradigmáticos como Árvore Torcida, Jardim de Pedra, Gaicho-ku, aos quais juntou O Prêmio e A Libertação e reuniu num conjunto ligado por um cordão. Em cada tela, pintou também caracteres da escrita japonesa apesar de ter sido aconselhado a não se aventurar nos ideogramas, dada a sua complexidade e à pouca experiência. Mas não obedeceu e, no fim, um crítico japonês escreve que, curiosamente, era prazenteiro vê-los naquelas pinturas.

O Japão havia atingido tão profundamente o seu ‘eu poético’ que transformou o seu alter-ego de muitos anos (o circunspecto cavaleiro Arkadin d’y Saint Amèr), num energético samurai, como relata nesta carta escrita no Monte Fuji:

“(…) morreu o templário Ark, de um colapso ético, numa estrada deserta, debaixo de uma capa… no mesmo instante nasceu o ronim (Samurai sem mestre, mas com muita crença…) Ak Satäma, embaixo de uma capa, numa estrada deserta…3”.

Do ponto de vista profissional, além do sucesso na Bienal, onde – segundo conta Zanini – as suas obras intrigaram e desconcertaram positivamente o público japonês pelas suas cores vibrantes e conteúdo erótico, Wesley fez uma exposição muito bem-sucedida na Tokyo Gallery. Para a apresentação recebeu uma crítica sensível do elegante Ichiro Haryu, que dizia:

“Wesley Duke Lee, com seu estilo descontraído, expõe a paixão e o ennui, a gargalhada e a modéstia que são parte dessa civilização única [o Brasil]. Os rostos femininos de suas pinturas formam estranhos signos, e sua fantasia é cheia de sensualidade. Em suas pinturas, parecem predominar os espaços brancos do niilismo, mas carregados de espontaneidade, espírito e energia.4

Acostumado a ser metodicamente recusado em todas Bienais e a sofrer constantes agressões no meio intelectual e artístico de São Paulo que o marginalizara – inicialmente por introduzir a figuração (sobretudo quando era de cunho erótico) e, depois, por motivos ideológicos –, sentiu-se, naquele momento, livre e integrado. Em Tóquio, não havia pequenas razões individuais que deslocassem o debate das ideias para o plano pessoal, o que significou sem dúvida uma trégua que lhe trouxe ânimo e confiança.

Zanini observaria que Wesley, longamente banido do ambiente artístico brasileiro – “muito sujeito ao dogmatismo abstrato” – começou a encontrar reconhecimento no Brasil via Japão5 . A confirmar essa impressão, enquanto permanecia fora, os cinco trabalhos enviados para a VIII Bienal de São Paulo haviam sido recusados; mas depois da divulgação do importante prêmio em Tóquio, a direção da mostra voltou atrás e, embora a contragosto, aceitou-os. Ocorre que as suas obras causavam constrangimento, principalmente um retrato considerado chocante e que foi modificado pela secretária geral da instituição, à revelia do artista. Ao retornar ao Brasil, esse episódio tempestuoso resultou na elaboração de um retrato sarcástico de Francisco Matarazzo Sobrinho e da sua secretária Diná Coelho6.

Ainda no Japão, terminada a exposição na galeria, pôde fazer, com a remuneração que conseguiu, uma sonhada viagem pelo Oriente e Europa para a qual convidou Lydia, pensando em levá-la para a Grécia (e resultou na série de desenhos Minha viagem à Grécia no helicóptero de Leonardo da Vinci).

Rex Gallery & Sons: o mercado de arte visto pelos artistas

Na segunda metade da década de 60, o Brasil vivia o considerado milagre económico. Wesley, assim, propôs a Geraldo de Barros, Nelson Leirner e a Carlos Fajardo, José Resende e Frederico Nasser (três dos seus ex-alunos) a criação da Rex Gallery & Sons. A ideia era criar uma galeria pelos e para os artistas, que aprofundasse nas pesquisas operativas e na perspectiva real da promoção de um artista, sendo um espaço de cooperativa e espaço experimental.

A Rex consolidou-se num contexto nacional e internacional de agrupamento de artistas em torno de ideais e ideias, possuindo afinidades com o grupo Fluxus e os movimentos de vanguarda, como o Dadá, transmitindo a ideia do livre pensar, experimentar e agir.

Parte importante da Rex Gallery, que concentrava exposições, experimentações, aulas e palestras era o jornal Rex Time. É evidente no jornal a influência da estética das publicações surrealistas. Durante 1966 e 1967, a Rex Gallery & Sons se tornou um amplo espaço de debate artístico, atraindo artistas, críticos e pesquisadores. Porém, financeiramente, não havia um retorno concreto, o que obrigou o fechamento da galeria, não sem antes de promover uma exposição de encerramento, que consistiu num happening de Nelson Leirner, e a edição do último número do Rex Time, o nº 5.

XXXIII Bienal de Veneza – 1966

A segunda metade da década de 60 foi muito fecunda para Wesley, tanto na criação como em exposições. Foi convidado e participou, em 1966, da 33ª Bienal de Veneza, em 1967, da 9ª Bienal Internacional de São Paulo. Esta contou com nomes como Jasper Johns, Robert Rauschenberg, Roy Lichtesntein, Claes Oldenburg, Andy Warhol, entre outros, todos ligados à pop art. Também, fora apresentada uma retrospectiva de Edward Hopper, mestre da figuração e realismo norte-americanos. Contou com 1.493 obras que iam do primitivo ao Construtivismo (COSTA, 2005, p. 130).

“Wesley participou desta [edição da Bienal] com desenhos da série Jean Harlow, cinco retratos da série Zona, dos quais A zona: é preciso luz (1967) foi vandalizada pelo público. Flávio de Carvalho considerou: “dos adeptos da Nova Figuração, Wesley é de longe o melhor”.

Arte ambiental

Ao participar da 33ª Bienal de Veneza em 1966, Wesley levou à cidade italiana a sua obra (de caráter futurista), ou como preferia chamá-la, ambientação Trapézio ou uma confissão (1966).

[Em 2015, a obra foi exposta na exibição The World Goes Pop, na Tate Modern, em Londres.]

Um ano após Trapézio ou uma confissão, Wesley realiza A Zona: considerações (retrato de Assis Chateaubriand), que para o artista, é um comentário sobre o poder.

A obra foi apresentada pela primeira vez no Museu de Arte Moderna de Tóquio. Porém, ao voltar para o Brasil, ficou retida durante 11 anos na alfândega, provocando a deterioração de determinadas partes e o desaparecimento de outras. Para evitar ser leiloado como sucata, foi doada ao MASP em 1980, exposta em 1992, na retrospetiva do artista, parcialmente restaurada.

Pode-se realizar um paralelo desta obra com a obra Sala de Jantar (Ambiente), 1971, da artista portuguesa Ana Vieira. A própria obra de Vieira já leva o nome Ambiente, e se caracteriza pela construção de um espaço onde se misturam referências visuais e sonoras que dialogam com a memória e os afetos.

Retorno ao Japão (1969)

Passados quatro anos, e depois de muitas ‘odisseias’ como a criação da Galeria Rex em São Paulo, a participação na XXXIII Bienal Internacional de Veneza e a construção durante dois anos de The Helicóptero, entre outros acontecimentos, em maio de 1969 Wesley retornou ao Japão para participar da mostra Dialogue Between the East and West no Museu de Arte Moderna de Tóquio. Nela apresentou um ambiente cinético inédito, The Helicóptero, visto na sua plenitude pela primeira e última vez, pois nunca tinha sido exibido no Brasil. Na volta ao país, ficou retido na alfândega por onze anos, período em que se deterioraram alguns mecanismos e outros desapareceram. A peça incluía som, luz e um circuito interno de TV, integrados pela primeira vez no Brasil. Hoje faz parte do acervo do MASP, mas está incompleto, sem movimento, muito distante do que foi originalmente. Assim, somente o público japonês teve acesso a essa obra precursora que, em Tóquio foi bem recebida, embora causasse transtornos na exposição pela sua sonoridade (fato inédito na época) e pela exigência de participação do público, que formava longas filas.

Do Japão, Wesley foi para os Estados Unidos e, depois de atravessar momentos de grande turbulência numa conturbada estadia em Los Angeles, realizou a série Iconografia Botânica.

O encanto pela caligrafia permaneceu e eclodiu na série Caligrafia, Ideograma, etc, de 1977, obras em que buscava, na escrita, sentidos latentes, além do significado das palavras. Na época em que as realizou, Wesley disse que a procura vinha da infância, continuou nas aulas de caligrafia em Nova York, mas tomou maior impulso no Japão. A tradição da caligrafia oriental fascinou-o; não deixou escapar a oportunidade de um aprendizado com o mestre Aoki Kiroyuki que o orientou principalmente sobre o significado dos gestos.

Assim, ao longo do que ele chama de a grande ‘viagem arquetípica’ em que desenrolou a sua vida e estruturou a sua obra, Wesley reconheceu que a vivência no Oriente foi uma situação única que lhe ensinou muito sobre si mesmo e sobre o Ocidente:

“Vivendo numa sociedade tão diferente da nossa, fui obrigado a reestruturar minhas atitudes perante as coisas, mesmo as menores, reformulando conceitos e experiências”.

A primeira tela representa KI (árvore) protegida do rigoroso inverno oriental. A segunda, SEKI TEI (jardim de pedra), representa o jardim da cidade de Kyoto. Na terceira, GASRIUKU (posar junto), o artista se projeta através do elemento coletivo, servindo de divisória na obra. A quarta, MEN (máscara), é a máscara do Teatro Nô que representa paixão. A quinta, ZENRA (nua), desmascara o lado sedutor.

The Helicóptero, 1969, arte imersiva
pintura sobre madeira, componentes mecânicos e eletrônicos, 400 cm de diâmetro (parcialmente destruído) – Coleção MASP

Notas
  1. COSTA, Cacilda Teixeira da. Wesley Duke Lee no Japão. In: LAÇOS do
    olhar: roteiros entre o Brasil e o Japão. Curadoria Paulo Herkenhoff. Textos
    Paulo Herkenhoff, Cacilda Teixeira da Costa e Marcia Mello. São Paulo:
    Instituto Tomie Ohtake, 2009. p. 341-52. ↩︎
  2. BIENAL do Japão premiou Wesley. Visão, São Paulo, 25 jun. 1965. ↩︎
  3. Carta a Lydia Chamis, Monte Fuji, Japão, s.d. ↩︎
  4. HARYU, Ichiro. Realismo mágico – apresentação de exposição Tokyo
    Gallery, Tóquio, julho de 1965. In: COSTA, Cacilda Teixeira da. (Comp.).
    Antologia crítica sobre Wesley Duke Lee. São Paulo: Galeria Paulo
    Figueiredo, 1981. p. 17 ↩︎
  5. Texto do catálogo da II Exposição circulante de obras do acervo do
    MAC/USP, São Paulo,1966. ↩︎
  6. O episódio está descrito em detalhes em: COSTA, Cacilda Teixeira da.
    Wesley Duke Lee: um salmão na corrente taciturna. São Paulo: Edusp:
    Alameda, 2005. p. 116-118. ↩︎

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